Agricultura regenerativa é chance real de equilíbrio climático
Com foco na redução da exploração ambiental e da emissão de gases do efeito estufa, tendência de regeneração vai além da sustentabilidade e é aposta do consumidor final
Apelidada de “amiga da natureza”, a agricultura regenerativa pode ser resumida como uma fatia do agronegócio com o propósito de produzir em escala sem prejudicar o meio ambiente a longo prazo. Apesar de ter sido criada na década de 1980, pelo americano Robert Rodale, se popularizou apenas agora que as mudanças climáticas atingiram um nível global alarmante. Assim, isso tem pressionado os produtores rurais a se preocuparem com as emissões de carbono na atmosfera.
Com potencial para atender as demandas mais urgentes, a agricultura regenerativa contribui com nove dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Aliás, tanto os ODS como o Acordo de Paris de 2015 destacam a necessidade de mudanças na forma como a agropecuária é gerenciada atualmente. Segundo os documentos, não só as emissões devem ser reduzidas, como a diminuição da biodiversidade, a desertificação e a degradação da terra precisam ter fim.
Consumo consciente é tendência mundial
Só para exemplificar a dimensão da atual relevância da agricultura regenerativa: multinacionais do ramo de alimentos, como a General Mills, anunciaram que comprariam uma parte de seus insumos de agricultores engajados e comprometidos no avanço da prática. Mais recentemente, a Cargill, outra gigante do setor alimentício, declarou que pretende destinar 10 milhões de acres de suas terras agrícolas, o equivalente a 4,04 milhões de hectares, ao modelo regenerativo. Atualmente, apenas 5 milhões de acres (2,02 milhões de hectares) dedicam-se aos orgânicos no mundo.
Da mesma forma, o perfil do consumidor final tem mudado drasticamente. De acordo com a Nielsen, consultoria especializada em compreender as motivações e necessidades do público, 42% dos brasileiros estão mudando seus hábitos de consumo para reduzir impactos. Desses, 30% revelaram ter atenção aos ingredientes que compõem os produtos. Ou seja, todos os caminhos têm levado agricultores, empresas corporativas, investidores e gestores de fundos ESG (Environmental, Social and Governance) a buscarem soluções no enfrentamento aos danos ambientais.
Sem dúvida, estamos diante de uma tendência que tem incentivado o mercado a rever o modelo de negócios. Mas como diferenciar a agricultura regenerativa da tradicional? É o que veremos a seguir.
Agricultura regenerativa vai além do sustentável
Há anos a sustentabilidade vem tentando neutralizar os erros cometidos no passado. Já a regeneração baseada em processos naturais quer transformar o trabalho no campo. Para isso, lança mão de metas ambiciosas e tangíveis em prol do equilíbrio climático.
Enquanto o sistema agrícola convencional exaure o solo, pressiona os ecossistemas e depende cada vez mais de defensivos químicos, deixando o agricultor em uma situação socioeconômica vulnerável, o objetivo da agricultura regenerativa é restaurar o que foi explorado e danificado. Além disso, visa aumentar a captura de carbono e melhorar a biodiversidade entre os polinizadores (especialmente abelhas e borboletas).
Mais especificamente, a agricultura regenerativa abre mão de fertilizantes sintéticos, monoculturas e métodos de produção industrial. Com isso, parte para técnicas que minimizem o uso de pesticidas e melhorem a saúde da água e do solo. Em resumo, o plano é produzir alimentos mais saudáveis sem deixar de aumentar a produtividade e os lucros do agricultor.
Princípios da agricultura regenerativa
Conheça os cinco princípios da agricultura regenerativa.
1. Solo
- Cobertura de solo durante o ano todo, para evitar que ele fique nú e, assim, sofra degradação e erosão;
- manutenção de forragem e material de pastagem;
- diminuição de perturbações, como aração e revolvimento do solo;
- redução de fertilizantes químicos e pesticidas;
- preservação das raízes vivas das culturas perenes;
- uso de espécies arbóreas.
2.Biodiversidade
- A diversidade de culturas cultivadas assegura uma nutrição mais equilibrada;
- dissuasão do uso de organismos geneticamente modificados;
- incorporação de gado na produção de cultura;
- técnicas de agricultura regenerativa como agrofloresta, silvopastoreio, agrossilvicultura;
- rotação de culturas ou cultivo sucessivo de mais de uma planta na mesma terra.
3. Água
- A matéria orgânica mantém a umidade do solo e melhora a retenção e infiltração da água;
- retenção de água nas plantas, criando um microclima local;
- diminuição do uso de irrigação e escoamento da água limpa para segurança rural;
- redução de fertilizantes químicos e pesticidas.
4. Socioeconomia
- Habilitação das comunidades locais para proteção e melhoria do meio ambiente e bem-estar;
- produção de alimentos consorciados que possam garantir segurança alimentar para as famílias dos agricultores;
- empoderamento das mulheres no campo;
- criação de condições favoráveis para apoiar as próximas gerações na permanência no meio rural.
5. Ambiente
- Reflorestamento de áreas desmatadas;
- restauração das pastagens (perto de 70% estão em processo de infertilização);
- apoio às necessidades alimentares globais;
- eliminação das emissões de gases do efeito estufa;
- sequestro e armazenamento de carbono;
- enfrentamento às secas, mantendo a matéria orgânica acumulada no solo;
- estudo do conceito de agricultura indígena;
- ajuda às economias locais;
- a agricultura local contribui para o desenvolvimento.
O próximo passo na transição é a certificação. Ao criar uma etiquetagem, o consumidor terá a chance de se conectar com o conjunto completo de valores da agricultura regenerativa.
Para nós, o tema é urgente e necessário. E para você?